O que está dito pela Rititi é o meu maior medo.
O meu medo não é de não ser promovida, porque no contexto em que trabalho as coisas são tão precárias que o conceito de promoção não é linearmente definido seguindo horários e produção semanal. O meu grande medo é de não conseguir arranjar um trabalho meu, um trabalho para o qual me preparei anos e anos. E o medo de me tornar pária por perder o "andamento".
Andamento é ser-se móvel em permanência e ser-se competitiva à escala mundial, acumular-se as experiencias cada vez mais corajosas ou mais loucas. Porque quem fez Kosovo acaba por fazer Sudão. Quem fez Sudão, vai parar ao Afeganistão, a partir daí o Iraque e o Congo já é só um passito... Por um lado, sem conhecimento de terreno não se serve para Genebra ou Nova Iorque, por outro lado, com excesso de terreno adquire-se o selo de "pied sale" (imagem auto-derisoire de quem anda de chinelo por terriolas poeirentas africanas ou de botas enlameadas pelas montanhas Afegãs) - o que também não é adequado para Genebra ou Nova Iorque. De maneira que se salta de um sítio para o outro na busca incansável ou utopica de um qualquer equilíbrio. Chegando-se aos 40 anos, o equilibrio que se encontrou é a incapacidade de se ser fiel... quer a sítios, quer a pessoas.
Por isso nesta vida, amancebar-se, (pior ainda) casar-se ou (ai jesus credo) parir é pura e simplesmente o fim da picada. Tem-se emergency sex, não se tem relações. Prova é que, há uns tempos, o Comité Internacional da Cruz Vermelha recusava candidaturas de pessoas casadas porque exigia uma dedicação incondicional à missão (como se o casamento fosse mais distracção que a falta dele).
Então tenho o mesmo sentimento ambivalente que ela tem: não quero chegar aos 40 anos encontrando o equilíbrio da infidelidade, mas também não quero ser excluída do andamento. O problema é que ninguém facilita missões para casais. Casais que vão juntos pelo mundo fora até existem, mas abdicaram de fazer o que queriam fazer, fazem aquilo que aparece porque ninguém investe em quem tem pouco andamento.
A grande batalha da minha vida será poder viver com o marido sem andar de rojo atrás dele, a fazer biscates aqui e ali e a tirar cursos como quem tira fotocópias sob desculpa de solidificar um currículo na denegação da possibilidade cada vez mais certa que este só se desenvolva pela aleatória lógica do acaso... Porque perdi o andamento.